segunda-feira, 12 de fevereiro de 2024

À mesa

À mesa, mais do que em qualquer outro lugar, conhece-se uma pessoa bem educada, porque, sendo o comer e o beber ações de todo materiais, assemelhar-nos-emos aos brutos, se não usarmos os devidos cuidados.

Na verdade, que se há de dizer dos que se curvam sobre o prato, e irrequietos lançam olhares ávidos para esta ou aquela comida ou bebida? Esses podem ser comparados aos irracionais.

Estando, pois, à mesa, em tua casa ou na alheia, especialmente num jantar de cerimônia, não te descuides de praticar com atenção ao menos estas principais regras de civilidade.

1. Antes de te pores à mesa, tira o sobretudo e depõe o chapéu. Para te sentares, espera que o façam os donos da casa; o mesmo observarás quanto a desdobrar o guardanapo, ao beber e ao comer. 

2. Se os lugares estiverem marcados, toma o teu; de outra forma, espera que o dono da casa o indique. Se tiveres liberdade de escolher, escolhe de preferência os últimos lugares, porque é melhor ser convidado a subir do que a descer...

3. Não te mostres descontentes do lugar que te coube e muito menos dos vizinhos que tens; antes é bom fazer-lhes, logo no princípio, um cumprimento e, durante a refeição, ter para com eles toda deferência e cortesia.

4. À mesa deves ficar bem composto. Não arregaces as mangas, não fiques debruçado sobre a mesa, nem tão pouco muito afastado, não apóies os cotovelos na mesa, mas apenas os pulsos. Não inclines a cabeça a cada bocado; deves levar a comida à boca e não a boca à comida; assim também o guardanapo aos lábios e não vice-versa.

5. O pão parte-se com a mão e leva-se à boca de uma só vez todo o bocado que se partiu. As bebidas levam-se à boca com a mão direita. Com a direita deve-se também fatiar e oferecer.

6. O guardanapo deve-se estender sobre os joelhos. Familiarmente tolera-se prendê-lo à roupa por uma ponta.

7. Com o guardanapo só se deve limpar os dedos e os lábios, principalmente antes e depois de beber; não é lícito enxugar com ele o que quer que seja. É reprovável o costume de enxugar com o guardanapo os pratos, os copos e talheres, salvo o caso de evidente necessidade. Tal ato mostraria que o convidado não tem muita confiança no asseio da família.

8. Se acontecer que tenhas mesmo de enxugar os talheres muito molhados, farás isto com miolo de pão, que depois se deixa no prato; nunca, porém, usarás o guardanapo ou a toalha.

9. A colher segura-se com a mão direita e não com toda, mas com três dedos e com certa elegância. Não se deve introduzir toda a colher na boca, mas só até a metade. No fim, põe-se a colher no prato com a parte côncava para cima.

10.  Conforme o uso mais comum, a faca se conserva na mão direita para cortar carne e outros sólidos, que se levam à boca com o garfo mantido na esquerda. A faca nunca se leva à boca.

11.  As viandas tiram-se da travessa com talheres a isso destinados, e nunca com os talheres individuais.

12.  É coisa reprovável servir-se dos talheres para tamborilar, gesticular, etc.

13.  Quem serve, deve começar pela pessoa mais digna e passar depois aos outros com certa ordem e sempre à esquerda do convidado. É costume servir pela direita as bebidas: vinho, café, etc. Nas refeições íntimas, os próprios comensais podem se incumbir de passar as travessas. Passando ao vizinho um prato, um talher ou outra coisa, deve-se fazer do modo mais cômodo para ele.

14.  Sê discreto ao servir-te da travessa. Toma o que estiver mais à mão e não voltes o prato em todas as direções para escolher o melhor bocado. Não leves nisso muito tempo, há outros que esperam a sua vez... Cúmulo de incivilidade seria cheirar as iguarias. Se por acaso ficares privado de alguma coisa, não dês sinal de desgosto, mas mostra-te indiferente e educado.

15.  Quando o criado te levar a travessa, não recuses servir-te, para que outros se sirvam antes de ti. Seria atrapalhar o serviço e as ordens do dono da casa.

16.  Se te sentares ao lado duma senhora ou duma pessoa notável, não só a deverás servir por primeiro, mas procura que nada lhe falte e oferece-lhe teus serviços quando perceberes que ela precisa.

17.  Nunca toques coisa úmida com as mãos. Só alimentos enxutos, como pão, biscoito, sanduíches, coxinhas, algumas frutas, etc., esses podem se tomar e levar à boca com as mãos.

18.  Trinchando, oferecendo ou servindo-te evita que caia molho sobre a mesa. E se cair um pedaço de carne ou coisa semelhante, deverás tomá-lo com o garfo e pô-lo num prato à parte.

19.  Quando colocares o talher na travessa ou na compoteira, fazei-o com cuidado, para que fique apoiado nas bordas e não mergulhe todo no molho.

20.  Grande grosseria é tirar alguma coisa da travessa e levá-la diretamente à boca. Pior seria tirar um pedaço de carne da travessa com o próprio garfo já usado.

21.  Não empurres o arroz para o teu prato. Tira-se às colheradas, vagarosamente.

22.  Geralmente, não peças coisa alguma, mas espera que te ofereçam. Não critiques as iguarias, nem dês sinal de que te não apetecem. Se depois de te servires de alguma coisa, não a puderes comer, deixa-a intacta no prato, que te será retirado.

23.  Olhar com avidez para o que se apresenta à mesa, olhar para a boca dos vizinhos, como para lhes contar os bocados, são atos de grande grosseria.

24.  Tudo quanto puder suscitar repugnância, deve-se a todo custo evitar, a saber:
a.       Mostrar ao vizinho o que de repugnante se encontrar na comida, como um cabelo, um inseto, etc. Em tal caso, chame-se o servente e entrega-lhe o prato para que o retire.
b.      Projetar da boca para o prato um osso, uma pedrinha, uma espinha de peixe, etc. Deve-se tirar com a colher ou garfo, sempre disfarçadamente, e depositar no prato ou numa vasilha própria para isso.
c.       Esgravatar os dentes com o garfo ou com as unhas, enxaguar a boca com vinho, café ou outro líquido para depois engolir ou cuspir fora, friccionar os dentes com os dedos ou com o guardanapo. Para limpar os dentes, servem os palitos. Quando saíres da mesa, não leves o palito na boca, à maneira dos pássaros quando fazem seus ninhos...
d.      Misturar no copo diversas bebidas, ou no prato muitas espécies de comida, a não ser nas refeições familiares.
e.       Deixar cair da boca os alimentos ou borrifar com ele o visinho, ao falares. Quem tiver esse defeito, fale pouco e com cuidado. Em nenhum caso porém, se deve falar com a boca cheia.
f.       Fazer barulho ao tomar a sopa, fungar, ou com os lábios e com a língua fazer outros ruídos intoleráveis.
g.      Dar estalos com a boca, como para mostrar que está saborosa a comida.
h.      Enxovalhar a roupa ou a toalha, enchendo demais o copo. Entornando molho, etc. Do copo deve-se encher somente três quartas partes do máximo, e nunca esgotá-lo completamente.
i.        Beber pelo prato: caldo, molho, calda de doce, etc. Só é lícito usar a colher se inclinar o prato, sem pretender esgotar o último pingo do líquido...
j.        Cheirar a comida e os copos, etc., tirar com os dedos alguma coisa que tenha caído no copo.
k.      Falar ou beber com a boca cheia, pôr na boca muita comida duma só vez.
l.        Segurar a beirada do prato para que não fuja, ou comer com o prato na mão, para ficar mais perto da boca...
m.    Comer às pressas; o que, além de incivil, é prejudicial à saúde. Evite-se porém, o excesso oposto.
n.      Abrir a boca, mostrando assim o que se mastiga, limpar o prato com o pão, lamber os dedos, enxugar os lábios com a mão ou com a manga e repor na travessa alguma comida que já estava no próprio prato.
o.      Virar demasiado o copo na boca, deixando impressa a marca dos lábios, ou olhar para os lados enquanto se bebe.
p.      Respirar, tossir, fazer qualquer rumor no copo, tomar longa respiração depois de beber.
q.      Coçar-se, cuspir, tossir, espirrar, tomar rapé ou assoar, sem absoluta necessidade.

25.  Não se deve falar muito ou muito alto, como os bêbados, nem ficar sério e carrancudo, como se se tivesse descontente do tratamento.

26.  Não se critiquem as iguarias e as bebidas, nem se louvem demasiado.

27.  Use-se especial cuidado nas conversações, para não sair dos limites da decência e do decoro, para o que de nada vale a fórmula “com o perdão da palavra”.

28.  Além destas regras gerais, daremos agora outras particulares para os diversos alimentos.
Pão — Em geral, o pão já se acha cortado em fatias num prato ou cestinho apropriado, quando não se distribui a cada um dos convivas um pequeno pão, que depois será repetido conforme for preciso. Toma-se uma ou duas dessas fatias de cada vez e não muitas; segurando a fatia com a esquerda, parte-se um bocado com a direita e com a mesma leva-se à boca. Se porventura se tiver que cortar o pão na mesa, tomar-se-á com a esquerda e cortar-se-á no ar ou apoiando-o ao prato, e não encostando-o na mesa ou contra o peito. Não se separe o miolo da crosta para comê-los separadamente; tão pouco é lícito esmiuçar o pão para depois comer aos pedacinhos.
Sopa — Se estiver muito quente, pode-se agitar um pouco com a colher no fundo do prato. Os goles devem-se fazer sem ruído. No fim poder-se-á inclinar um pouquinho o prato para recolher o resto, mas sem tomar o prato na mão.
Enquanto se toma a sopa, não se deve beber qualquer bebida, o que é muito prejudicial aos dentes.
É reprovável encher demasiado o prato, ensopar o pão, principiar num ponto do prato e encontrá-lo com a colher e tomar duas vezes uma só colherada.
Sal — Não se deve tirar o sal com o dedo, nem com o cabo da colher ou do garfo. Quando não houver colherzinha apropriada, tirar-se-á com a ponta da própria faca, se ainda não tiver sido usada. Em caso contrário, pede-se uma ao criado; não o querendo ou não o podendo fazer, coma-se do mesmo modo, ou então deixe-se no prato.
Molho — O molho serve-se com uma colher apropriada e não virando a vasilha no próprio prato, a não ser quando é servido em vidro como o molho inglês.
Carne — A carne, assim como os legumes, come-se com o garfo. Não se toca com as mãos, não se destaca dos ossos com os dentes, mas com a faca e o garfo. Os ossos de nenhum modo se devem roer ou chupar; não se põem sobre a mesa ou debaixo dela, mas na beirada do prato ou vasilhame apropriado.
A carne pode-se comer de dois modos: cortando-a antes em pedacinhos, que se levarão à boca com o garfo, ou, o que é mais comum, segundo o costume inglês, mantendo na direita a faca com que se cortam vez por vez os pedaços, que são levados à boca com o garfo conservado na esquerda.
Peixe — Tira-se o peixe com a faca ao longo do dorso e, quando estiver servido, com o auxílio do garfo separam-se as espinhas.
Manteiga — A manteiga é melhor não estendê-la de uma só vez por todo o pão; à medida que se parte o pão, passa-lhe a manteiga, levando-o depois à boca.
Quando a manteiga não for servida a cada um dos convivas, deve-se tirar da manteigueira com a faca, que ao lado dela estiver, uma certa quantidade, pô-la à beira do prato e servir-se daí.

29.  Apresentando-se à mesa uma iguaria que não conheces e não sabes como se come, não te deves servir dela. Assim também, não aceites a incumbência de trinchar, se não o souberes, pois qualquer imperícia pode ter deploráveis conseqüências. Não é pois delicado insistir muito para que alguém tome a si tal encargo.

30.  Quando for tempo de mudar os pratos, deixa que os mudem sem cerimônia. Cabe ao servente tirá-los e não a ti oferecê-los. Os que retiram os pratos devem fazê-lo do lado direito.

31.  Se durante a refeição houver leitura, deves escutá-la com atenção e em silêncio, evitando fazer rumor com os talheres; o mesmo se deve observar se houver canto, música, declaração ou coisa semelhante.

32.  Para os brindes, os costumes variam conforme os países. Entre nós está prevalecendo a praxe de não se tocar entre si as taças ao findar o brinde, mas fazer com elas simples acenos às pessoas brindadas.

33.  A oração antes e depois da comida é uma prática que um cristão nunca deveria omitir.

34.  Para coroar este capítulo importantíssimo, resta dizer que a primeira e mais importante regra de educação à mesa é a temperança no comer e no beber. Quem come até se empanzinar ou bebe até ficar alterado, é indigno de sentar-se à mesa com pessoas educadas. O alimento nos é dado, não para a satisfação do apetite, como os brutos, mas sim para conservarmos são o corpo, instrumento da nossa alma. Não é, pois, bem entendida a civilidade daqueles que insistem muito com os comensais para que comam e bebam.

35.  Não será supérfluo recomendar que se evite o menor estrago de comida. Quantos pobres cobiçam os nossos sobejos! Jesus Cristo, após o milagre da multiplicação dos pães, ordenou aos seus discípulos que recolhessem os pedaços que sobraram, para não se perderem.

36.  Um bom cristão não aceita, em dias de abstinência, convites de pessoas que não a observam. Sendo surpreendido em tais refeições, deve-se ter bastante coragem para obedecer às leis da Santa Igreja. O efeito de tal proceder é sempre a estima dos comensais ajuizados.
Enfim, nem todas as regras aqui compendiadas têm sempre o mesmo valor. Em família e no seio das comunidades, permite-se algumas exceções; nunca, porém, em detrimento da cortesia, pois aí, mais do que em qualquer outro lugar, deve dominar o afeto, que é a norma da cortesia.

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Algumas coisas que se devem evitar:

Fazer sopas de pão dentro do molho ou café, salvo o caso de intimidade.

Encher o garfo de comida com a faca, para depois lavar à boca. Devemos levar no garfo o que ele pode apanhar com facilidade, e não mais.

Pegar no talher desastradamente. Devemos apoiar o cabo da faca e do garfo na palma da mão. A maneira de se manejar graciosamente o talher, só se consegue pela prática e pela observação.

Estar com o garfo espetado à maneira de punhal; devemos sempre levar a comida à boca com um movimento curvilíneo ou do garfo ou da colher.

Comer e engolir com sofreguidão. Devemos fazê-lo sempre devagar.

Mastigar ruidosamente ou fungando.

Molhar o pão ou os biscoitos no leite, café, chá, etc., salvo o caso de muita intimidade. Leva-se o bocado à boca, mastiga-se um tanto e depois toma-se um gole do líquido. Esta regra é geral também para qualquer alimento sólido.

Alargar os cotovelos, quando se cortam as iguarias. Devemos conservar os cotovelos cingidos ao corpo.

Comer com a colher tudo o que pode ser comido com o garfo. Mesmo os gelados são agora freqüentemente comidos com o garfo.

Devorar a última colher de sopa, o último bocado de pão, a última garfada de qualquer iguaria: a limpeza dos pratos não pertence aos convivas...

Estender a mão por diante das outras pessoas, na intenção de pegar qualquer coisa que esteja longe de nós.

Pedir ao vizinho que nos dê qualquer objeto que não esteja ao nosso alcance, salvo quando em família. Para isso é que servem os criados (quando os há).

Brincar com o guardanapo, com o copo ou com o garfo, ou com qualquer outro objeto.

Limpar o rosto ou o queixo com o guardanapo. Devemos somente passá-lo de leve pelos lábios.

Voltar as costas a uma pessoa com o propósito de falar a outra.

Conversar por diante da pessoa que está sentada ao lado.

Estar acanhado. Devemos fazer diligência por estar à vontade, e ter por nós próprios o respeito que devemos aos outros.

Deixar cair a faca ou o garfo no chão; caso porém, tal aconteça, não devemos ficar atarantados. Dirijamo-nos calmamente ao criado, pedindo outro, e não pensemos mais em semelhante ninharia.

Debruçar-se sobre a cadeira.

Pegar na mão um pedaço de galinha ou de outra carne.

Usar palito à mesa sem necessidade; caso nos sirvamos dele, devemos cobrir a boca com uma das mãos, enquanto tiramos dos dentes o que nos incomoda.

Comer cebola ou alho, quando se esperam visitas; devemos guardas as comidas com tais temperos, para quando jantamos sozinhos e tencionamos ficar sós algumas horas depois do jantar. Não é agradável manifestar pelo olfato quais foram as nossas refeições. Para o cheiro da cebola ou alho é eficaz, no entanto, um copo de leite tomado logo a seguir.

TEIMAR COM UM CONVIDADO PARA QUE COMA. ANTIGAMENTE ISTO ERA COSTUME E ERA TAMBÉM CONSIDERADO DELICADEZA DA PARTE DO CONVIDADO ACEITAR OU DESCULPAR-SE POR SE VER FORÇADO A RECUSAR. ABORRECER UM CONVIVA COM OFERECIMENTOS CONTÍNUOS, É CONSIDERADO MAU GOSTO.

Como convidado, dobrar o guardanapo quando acabares de jantar. Basta que o ponhas ao lado.

Ao recusar um prato, dar como razão “que pode fazer mal” ou “que não gostas”.

Fazer a mais leve alusão à dispepsia, indigestão ou incômodos semelhantes. A digestão é um assunto muito íntimo, que fica só para nós.

NÃO BRINQUE COM OS TALHERES...

Fazer notar, como conselho de amizade, que uma certa vianda é indigesta ou prejudicial a qualquer doença, etc. Não é delicado metermo-nos na vida alheia; naturalmente, a pessoa a quem nos dirigimos está muito mais apta do que nós de saber o que lhe faz mal ou bem.

Mostrar uma correção de maneira demasiado afetada; devemos ser naturais na nossa delicadeza. Mais vale cometer leves faltas, que mostrar esforços para não cometê-las.

Agradecer ao dono ou à dona da casa o jantar para o qual foste convidado; devemos somente à saída expressar o prazer que sentimos com o convite.

Assobiar ou cantar, estando à mesa.

Beber pelo pires.

Meter a colher na chávena de chá ou de café, enquanto servirem; este costume faz que muitas vezes se entornem a chávena. Devemos deixar ficar a colher no pires e não na xícara.

Levantarmos da mesa antes de acabar a refeição.

Ler jornais ou livros à mesa, quando haja outros convivas.

Deixar cair pingos de café, leite, etc., ou deitar nódoas de gordura na roupa. Basta um certo cuidado para evitar estes incidentes.

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